POST 01 – INTRODUÇÃO AO ESTILO
A seguir, começo o primeiro post de nossa série, o "ROTEIRO EM TRÊS POSTS". Leia se estiver, realmente, interessado em praticá-los. Roteiro não é algo complexo, mas exige treino e, acima de tudo, entendimento. Portanto, os tópicos abaixo estarão disponíveis aqui no Blog e, caso dúvidas brotem, não hesite: vá ao fim do post e deixe-as.
Definições importantes
"O que é roteiro?"; "pra que serve um?"; "como se escreve?"; "como se formata?". São muitas dúvidas em torno de um assunto só, mas a maior parte delas passa a tomar forma quando entendemos, realmente, o conceito de "roteiro" como gênero textual descritivo.
Pois bem, o gênero não possui uma definição precisa. Isso ocorre, porque o termo possui definições únicas para as diversas pessoas que colocam as mãos no roteiro. Falar nisso, é uma boa hora para deixarmos claro que o "roteiro virtual", tal como estamos acostumados, tem o conceito de um roteiro de TV ou cinema e, por assim ser, possui as mesmas características que tais - não é da caixinha de surpresas que os roteiros do mundo virtual à fora são padronizados. São (ou deveriam ser) como os da Globo, SBT, Record e, evoluindo um bocado, FOX. Mas, voltemos as definições do roteiro...
→ Para o autor, o roteiro é um papel, contendo inúmeras letras que, juntas, formam palavras; essas, frases; e, essas, expressões com significados amplos. Um desses significados é aquilo que está na cabeça do roteirista/autor, isto é, sua ideia.
→ Para o produtor, seu objetivo final. Sua tarefa é arrecadar dinheiro, locações, escalar atores e tudo, com o objetivo na tela da TV: assistir ao que produziu, contando suas notas de dólar. Tá, vale real.
→ Para o ator, o roteiro é a porta para conhecer quem ele será. Seu personagem está ali; o roteirista tem que ser bom o suficiente para fazer o ator encontrar seu personagem e saber defendê-lo à todo custo.
→ E, por fim, para a equipe técnica, é a base para começar as gravações: que serão definidas com base no texto. Uma câmera mais potente; uma luz mais acentuada; uma fotografia mais dark. Tudo vai depender do texto e de sua proposta.
Bem, apesar de tudo isso, a pergunta ainda deve permanecer. Por isso, tentarei ser o mais objetivo, com uma explicação generalizada à dúvida nossa de cada dia: o que é um roteiro? Curto e grosso, é o texto que narra, sucessivamente, as cenas que compõem o filme, série ou novela. Nele, encontramos as ações, diálogos de personagens e elementos visíveis/audíveis que os localizam.
Com base nisso, é importante deixar claro, também, que nem todos os roteiros são cumpridos, passo a passo, pela direção ou equipe, por exemplo. Isso acontece, porque o diretor tem uma visão muito mais ampla que o roteirista e, por isso, realiza perspectivas diferentes das apresentadas no texto. É difícil achar um diretor que goste de, por exemplo, ter, no texto, a posição da câmera ou do DOLLY. Portanto, é válido sabermos, desde já, que TERMOS TÉCNICOS são fundamentais, mas apenas os BÁSICOS. Roteiro já é TÉCNICO. Quem acha que ROTEIRO VIRTUAL é diferente do ROTEIRO REAL pela falta de técnica, está enganado, visto que o gênero é, por si só, uma mistura de técnicas: a de dramatizar, principalmente. Em suma, o roteirista está longe do que o diretor faz, isto é, a decupagem: as indicações de planos, iluminação, movimentos de câmera, de atores etc.
De que um roteiro é formado?
Agora, vamos ver como essa definição toda, do item anterior, atua na prática. Observe a cena abaixo, extraída do roteiro do filme "Cidade de Deus", produzido pela O2 Filmes, Globo Filmes e Videofilmes e distribuído por Lumière Brasil. É uma adaptação; roteiro de Bráulio Mantovani.
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Um roteiro é formado, basicamente, da seguinte estrutura:
- Cabeçalho - que revela o número de cena (3); o local (campinho) e o tempo (dia). Vale destacar que são vários, os tipos de cabeçalhos, mas o importante é possuir as quatro informações destacadas. Um novo cabeçalho é necessário a cada vez que mudar o lugar e/ou tempo - ou, a mudança deve ser feita em novo parágrafo, com letra em CAIXA ALTA. Exemplo:
Mariana levanta-se da cama e, sonolenta, ENTRA no
BANHEIRO
Abre a torneira, (...)
- Descrição - segue a ação da cena. O que está acontecendo? Quem está na cena? Onde está? Deve ser o mais clara possível, mas valem trechos evocativos, como vemos em: "(...) que se revela um frangueiro". Mas, atenção, não exagere nesses trechos evocativos, como no exemplo abaixo:
LUCAS lendo um ofício, afoito; está procurando seu nome na lista gigantesca de classificados para o vestibular, que havia feito no mês passado.
- Personagens - no roteiro, e frise isso, os personagens não expressam suas emoções através de pensamentos ou narrações em OFF, mas com ações. Sempre que aparece pela primeira vez, é interessante descrever seus principais traços físicos - nunca os emocionais. É comum, também, que, em sua primeira vez, surja em letras maiúsculas.
- Diálogos - por não existir narrador que conte tudo para nós, é preciso que nossos personagens FALEM, visto que esse é o principal jeito de a história movimentar-se. Como dizer que o personagem é homossexual? Monte ações e falas que indiquem isso!
- Rubricas - são "pistas" para o ator; como esse deve pronunciar o diálogo. Mas, atenção: não são muito aceitas, pois, na maioria das vezes, ridiculariza o trabalho do ator. Ou você não sabia que escrever (IRÔNICO) é uma redundância, dependendo do diálogo?
Em "Cidade de Deus", em ambas as falas, temos a expressão "V.O." como rubrica (essas são postas sempre entre parênteses. Não confunda com os travessões, no texto narrativo). Mas vale lembrar a diferença entre V.O. e O.S. A primeira, voice over, representa a voz de um personagem que temos em cena, mas que não abre a boca para pronunciá-la. Pode ser uma narração, um pensamento ou, até mesmo, a voz que vem de um telefone. Já off screen representa um personagem que não está sendo visto no plano; pode ser alguém gritando de outro cômodo ou similares. "OFF" é uma expressão vulgar para ambos e indefinida; pouco utilizada.
Observação: a rubrica "(tom)" é uma indicação não específica para chamar a atenção do ator e fazê-lo entender que uma leve modificação na intensidade dramática é requerida.
- Transições - são indicações bem simples: como a cena deve ser cortada? Devagar, esfumaçando? Em um "FADE OUT" ou em um "CORTE RÁPIDO"? Bem... A única pouco aceita é a "CORTA PARA", porque é a mais óbvia. Se estamos ao fim de uma cena, passando para outra, é evidente que teremos um corte, não? Logo, para evitar repetir a expressão, caiu em desuso. Quando o corte é simples, apenas passa-se de uma cena pra outra. Assim:
CARLA - Vamos conosco, Luís?
Luís ENTRA na sala, sem responder.
CENA 04. SALA – INT/NOITE.
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Temos outras transições, tais como: DISSOLVE PARA; CORTE DESCONTÍNUO (quando há uma passagem de tempo); MATCH CUT; FUSÃO PARA, etc.
- Indicações relevantes - como no exemplo acima, o ENTROU. "ENTRAR", "SAIR" e nome de personagens que estão aparecendo pela primeira vez no roteiro são, comumente, escritos em maiúsculo. O mesmo vale para itens importantes na cena, como "Fulano saca a ARMA". Dispensa-se o uso das letras maiúsculas para expressões comuns.
Bem, perceba que no trecho do roteiro indicado, não temos praticamente nenhuma informação técnica exagerada. Não há travellings, chicotes, panorâmicas, close-ups e outros. Há o básico. E os roteiristas iniciantes devem seguir o mesmo exemplo.
Para terminar o item, são sugeridos, de forma a padronizar os roteiros brasileiros, o seguinte:
- Fontes: Courier New (tam. 12) ou Times New Roman (tam. 12). Cor preta em ambos.
- Cabeçalhos: em negrito.
- Descrições sem negrito/itálico ou afins.
ADENDO: todo o texto deve ser escrito no tempo verbal PRESENTE; esqueça os pretéritos e os futuros.
Dramatização I - Introdução
Passada essa parte de identificação da estrutura e entendimento básico do gênero, é chegada a hora da parte mais importante - e que, por assim ser, será dividida em III –, a dramatização. Durante os três posts, teremos três módulos (um em cada) para a temática, divididos em INTRODUÇÃO, PROGRESSÃO e FERRAMENTAS. Portanto, fique ligado e vamos à introdução!
O que é dramatização, pois bem? Dramatização é uma derivação da palavra de origem grega, drama; ou, meramente, ação. E o que seria ação, em se tratando de roteiros? Dramatização!
Essa é a hora que você questiona-se o motivo de nosso módulo: se dramatizar é ação, qual sua importância para um roteirista? Teria mais cabimento aos atores. Não. Acontece que o processo de dramatização é o que irá definir o relevo do texto. Em outras palavras, você pode escrever um texto sem emoção e totalmente frio, que ele será, sem dúvidas, creditado como péssimo. Isso tudo, devido a um único quesito: a dramatização.
Quando não há coexistência entre cenas e diálogos, capaz de tornar a leitura do roteiro uma caixinha de surpresas, a qual cada página é uma nova emoção, resta ao leitor mergulhar em lago de palavras sem emoção e de cenas sem significados. Quando você chora ao assistir – pela primeira vez, óbvio – as cenas de Titanic; ou, que seja, "A culpa é das estrelas", você está entrando na onda da dramatização! E você questiona: "Tá, mas o que importa disso tudo?" - Simples! Entendermos esse conceito tão abstrato.
O âmago de um roteiro é sua dramatização: como a encenação, a montagem e tudo o que está sendo lido, montando-se na mente de quem o faz; é a realização de uma história por meio da interpretação. A concepção da história, então, guiará à elaboração de um enredo (variadas ações/acontecimentos - durante a obra) com um tema (ponto de apoio).
Aqui, então, vale uma observação. No roteiro, propriamente dito, temos o que se chama de questão dramática. É a questão que deve ser respondida até o fim da novela/série/episódio/capítulo/filme/peça, ou seja lá qual for sua pretensão. O importante, é que essa questão esteja óbvia - ou que torne-se óbvia o mais rápido possível, pois é ela que irá agarrar seu leitor com todas as forças! Vale destacar que essa questão é flexível. Pode ser relacionada a aspectos internos ou externos do personagem; ser concreta ou não; ser mudada no decorrer do roteiro.
À contribuição para a questão dramática, temos o protagonista da história. Ativo em seus comportamentos e com características peculiares, devem ter uma meta. Essa meta, porém, atrapalhada por obstáculos. Vale dizer que esse "protagonista" pode ser qualquer coisa, desde uma família, aos animais dela. Então, quanto mais interessante for a meta desse protagonista e mais sádicos seus obstáculos, mais resistente será a questão dramática.
DRAMA = CONFLITOS + O INESPERADO
Essa fórmula é antiga. Circulando por vários roteiristas, sites de Internet e mais variados livros de cinema, é a mais utilizada – e, talvez, por você, inconscientemente! Mas o que vale é que ela é essencial. Nenhum leitor gastará seu tempo com um texto que não lhe traz emoção ou suspense, ou seja lá o que ele estiver procurando no roteiro. Ele quer, sempre, pronunciar: "Interessante! E o que vai acontecer agora?". Mas preste atenção: as respostas para a pergunta do leitor não deve ser imediata. Não procure elucidar todas as questões e acabará na temida frase: "Não acontece nada!". Portanto, lance sua questão dramática aos poucos e, sempre, baseie-se na fórmula acima.
Syd Field escreveu: "Todo o drama é conflito. Sem conflito, não há ação. Sem ação, não há personagem. Sem personagem, não há estória. E, sem estória, com certeza não há roteiro."
Por isso, faça o que mais se espera, amigo roteirista: misture seus conflitos, suas barreiras – aquelas, que impedem o protagonista a todo tempo, com o inesperado: a vitória repentina dele ou uma reviravolta surpreendente. Vale muita coisa aqui, dentre elas, a sua criatividade, um elemento essencial para qualquer escritor.
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Dê continuidade à cena abaixo.
- Escreva, no máximo, duas páginas do Word;
- Utilize os tamanhos e fontes recomendados em nosso estudo;
- Atenção: a cena abaixo faz parte de um dos capítulos da novela "Celebridade" e sua sequência não deverá ser, obviamente, copiada ou retalhada. Construa a sua.