O episódio piloto de Caminho Único Gerações: Anos de Rebeldia não estreou, mas recebi em minha humilde redação para avaliar a trama que se passa durante a década de 60.
Tu vai cantar muito isso aê, bicho |
A primeira temporada pretende abordar a ditadura militar, a luta dos jovens contra a opressão e, no meio disso, a trama de Rita Feltrin (Giovana Rispoli) que, na série original, é ninguém menos que a diretora da Escola Comunitária Caminho Único, interpretada por Marieta Severo (sem a tesoura. Entendedores entenderão).
Deslize lindamente para baixo e confira o que achei do piloto de Caminho Único Gerações.
As 5 vezes em que o spinoff de Caminho Único pecou
Narrativa desnecessária
A trama já começou com um problema já detectado em X-23 (série de super-heróis do mesmo autor), se bem me lembro: a narrativa explicativa (acho que criei agora, não sei, falta pesquisar), que é quando o autor tentar explicar uma cena que poderia, facilmente, ser mostrada. Vejamos um belo exemplo:"RITA e JOAQUIM estão sentados a um dos bancos do pátio, tem poucos alunos ali e os dois estão afastados.Estão conversando sobre os cartazes contra o governo militar que estão sendo distribuídos, misteriosamente, pelo colégio."
JOAQUIM
[Sussurra para RITA]
— Onde você os colocou dessa vez?
A cena a seguir já indica que Rita estava colando os cartazes nos fundos da escola, logo, a cena que grifei é desnecessária. Entretanto, há uma cena narrada que foi bem colocada e não configura uma narrativa explicativa:
"[...]As três estão rindo, contando alguma fofoca da instituição."Observe que não sabemos do que se trata a "fofoca", logo, é perfeitamente permitida em um roteiro.
Sublinhados, eu vou te usar!
Não use, se puder. Tivemos, na cena 4, a famosa série de planos (uma sucessão de acontecimentos curtos em vários cenários ou dentro do mesmo ambiente, muito comum em séries), nada de espantoso, se não fosse o abominável uso do sublinhado (em excesso). Veja:
01: RITA [Giovanna Rispoli. 17 anos, cabelo negro e pele branca] está parada em frente ao balcão enquanto o garçom faz seu pedido, uma taça de vaca-preta [Uma bebida feita com sorvete de baunilha e Coca-Cola].
Isso ocorreu até o número 3. Trata-se da famosa poluição visual. Evite.
O uso repetitivo do verbo estar
"Está observando", "está penteando", "está entrando"...Nada contra ao verbo Estar, eu até uso, mas ele torna-se um vício de linguagem quando há repetição. Como melhorar nesse aspecto? Vejamos:Está observando > observa
Está entrando > entra
Está penteando > penteia
É claro que há situações em que o verbo e o gerúndio precisam dar o ar da graça, como no trecho "Úrsula está sentada no sofá" ou mesmo o "está observando", mas quando puder, substitua de vez quando. Vai estar mais fluído.
Falta de atenção aí, broto!
"sem expressão uma reação" > em expressar"pia de levar roupa" > lavar
"você também pedir pra sair" > você também VAI pedir
Além desses pequenos, mas notáveis problemas, algumas vírgulas resolveram fugir da ditadura militar, mas nada que pudesse comprometer o andamento da trama.
E a tal da dramaticidade?
Lembra que esse foi um dos pontos falhos em X-23? Pois então, em Caminho Único Gerações: Anos de Rebeldia, o piloto mostrava a opressão vivida pelos jovens que, mesmo com o medo estampado na cara das pessoas, desafiavam os militares, colando cartazes no colégio. Até aí tudo bem.O problema é que eu esperava uma ação dos militares: jovens sendo levados e torturados, cartazes sendo retirados das paredes, balburdia nas ruas – tudo isso em preto e branco para, em seguida, revelar o cenário de tensão no Colégio Coração da Santa Maria. Não vi nada disso, apenas comentários a respeito. Mais que dramaticidade, faltou profundidade ao piloto.
A temporada abordará muito isso, suponho, mas o piloto é a porta de entrada de toda trama, precisa convencer do drama apresentado, mostrar o cenário em que vamos adentrar. Eu entendo bem como escrever piloto é sempre mais difícil, porque, muitas vezes, se você não convence de primeira, dificilmente o leitor retorna para tentar se convencer na segunda.
Pontos positivos de Anos de Rebeldia
Em boa parte tive a impressão que a maior preocupação do autor era o de ser fiel à época, no quesito musical e no linguajar. Não pesquisei muito a respeito, mas não vi furos de roteiro nessa área (quem viveu a década de 60, por gentileza, verifique).Apesar de sentir falta da opressão propriamente dita, ou seja, os militares tocando o terror nas ruas de São Paulo, é perceptível a tensão em que a juventude vive, principalmente a Rita, a jovem destemida que cola os cartazes no colégio na luta por justiça (seu irmão foi levado pelos militares).
Não encontrei tantos problemas como ocorreu em X-23. A revisão foi melhorada, menção a Roberto Carlos (não se esqueça de mencionar a Jovem Guarda, auge da década), gírias (morou, broto), preconceito contra o gênero rock, sensação leve de estar naquela época.
Caminho Único Gerações: Anos de Rebeldia é simpática, leve, mas sem deixar de abordar os temas sociais. Portanto, são 3 pontos positivos:
- Boa revisão
- Sem furos de roteiro notáveis
- Fluidez de texto razoável
Quer uma dica, João Paulo Ritter? Não se estenda muito, como nesta cena:
"Mostra os corredores do colégio cristão, estamos vendo alguns cartazes espalhados. Estes cartazes apresentam mensagens contra o governo militar."
Em vez disso, opte por:
Se puder mostrar as mensagens, fica ótimo também, mas essa é a minha opinião, e não significa que seja o mais correto.
"Mostra os corredores do colégio cristão. Cartazes com mensagens contra o governo militar espalhados em vários pontos".
Caminho Único Gerações promete ser boa sim, principalmente se o autor cuidar dos pontos negativos mencionados neste post. Curtiu essas Primeiras Impressões? Então não deixe de comentar aqui ou no Facebook!