Especial Halloween | Conto 1: Um Fio de Esperança

Cristina Ravela
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Um fio de esperança
Por Raquel Machado





Acordo com as batidas incessantes na porta. É noite ou dia? Não que isso tenha relevância.
Levanto de mau grado e arrasto-me até a entrada da pequena casa. Abro a porta pronta para xingar quem quer que seja, porém nada consigo ver. Uma rajada de vento me atinge, o que me faz sentir um calafrio repentino. A chuva se aproxima.

Procuro alguma coisa para comer. Entro em casa e abro os armários, porém eles estão vazios. Tão vazios como minha alma. Ao fundo avisto um pacote de bolacha, que vai servir.

Sento na mesa e vejo um inseto correndo sobre ela. Não é exatamente uma barata nem tampouco um besouro, parece algo dos dois. Bicho nojento. Mato-o sem dó.
Abro o pacote de bolacha e vou mordê-la, quando vejo o mesmo bicho. Este parece encarar-me nos olhos. Fico hipnotizada por aquele pequeno ser de oito patas. Engulo a bolacha junto com o bicho que me atormenta. A náusea me atinge.

Vou até o banheiro e vejo meu reflexo no espelho. Eu ainda sou a garota mais bonita do mundo. Começo a escovar meus cabelos, percebo que eles estão caindo em grandes tufos, uma praga da doença que me aflige.

Ligo a torneira e, ao lavar minhas mãos, percebo algo estranho. Pedaços de pele começam a se desprender. Minha linda pele clara não existe mais, em seu lugar vejo somente os músculos do ser imperfeito que eu sou.
Grito desesperada. As luzes se apagam e um silêncio preenche o ambiente. Tento aguçar meus ouvidos, e escuto meu próprio grito, que parece ecoar pela casa.

Corro para sala tentando me esconder. Sinto meus pés pesados. O tapete da sala parece areia movediça. Arrasto-me com dificuldade até um canto e sento. As histórias com doenças terminais que escutei, elas costumavam ver e ouvir coisas, então talvez seja tudo parte de minha imaginação.

Acordo dos meus pensamentos ao sentir pingos de chuva caírem sobre minha cabeça. Maldita casa, terrível, urbana. Sinto que a água não é límpida, mas sim vermelha, e sua consistência é diferente, parece sangue. O sangue de todos que maltratei.

Corro para a porta, mas não consigo encontrá-la. Estou trancada a mercê dos mortos que vêm me buscar, cobrando por meus pecados. O sangue sobe pelos meus pés, ao mesmo tempo, que escuto o choro das almas sofredoras.

É o meu fim. Me afogo, o ar sai dos meus pulmões Coberta por aquela corrente sanguínea, abro os olhos e vejo uma criança. Instintivamente a reconheço, aqueles olhos da época em que minha inocência era pura. Ela estende sua mão e tento com muito esforço pegá-la, mas já não tenho forças. Nos entreolhamos e, por um instante, sinto que ainda existe esperança. Sem pestanejar sucumbo.

Acordo sobressaltada com um barulho incessante na porta. A chuva cai do lado de fora. Olho para o criado-mudo onde estão os vários remédios que fazem parte de minha vida. Maldito sonho.
Caminho até a porta de mau grado. Abro e não vejo ninguém, escuto apenas o barulho do vento que sussurra:
- Ainda há tempo.




Raquel Machado

Autora do Especial Halloween

Formada em Ciência da Computação e participa do mundo artístico desde criança, realizando apresentações de dança e teatro. Leitora compulsiva, ministra desde 2010 o blog Leitura Kriativa onde divide suas impressões com os leitores.Em 2015, publicou seu primeiro livro "Vingança Mortal" de forma independente pela Amazon.

Em 2017, participou junto com outros escritores do livro "A Escolha Perfeita", publicado pela editora Ella. Em 2018, participou de diversas antologias: De Volta a Salem (Terror),Zodíaco (Terror), Romances de Época (Romance), O universo conspira amor (Romance), Sonhos e Fantasias (Infantil), Relacionamentos Virtuais(Terror/Romance) e As Faces do Horror (Terror).

Em 2019, participou da antologia Arrependa-se (Terror), foi convidada para participar da minissérie Saber Amar (Cyber TV) e organizou a antologia Mascotes, com lançamento na Bienal do RJ.A autora reside em Caxias do Sul/RS, junto com seu marido e uma estante cheia de livros.

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