Review | A Cesareia usa recurso falho para concluir minissérie, mas surpreende

Cristina Ravela
0
Deus ex machina é recurso nada criativo. Será que prejudicou A Cesareia?

"Eu voltei, voltei para infernizar, porque aqui, aqui é o meu lugar", já cantava Roberto Carlos, não é mesmo? Hoje trago a review de A Cesareia, minissérie exibida entre janeiro a fevereiro deste ano e escrita por Samuel Brito para a CyberTV.

Review de A Cesareia - O Governo do Mal
Review de A Cesareia.

A Cesareia - O Governo do Mal se passa na Grécia Antiga. A minissérie conta a história dos irmãos Apolo e Aquiles, dois pobres coitados que, ao retornarem a Atenas, descobrem que seus pais morreram devido ao tifo e que, em suas terras, agora, há um teatro.

Até aí tudo bem, o problema é que os irmãos ficam furiosos pela frieza do rei Petrus II. Então, num certo dia, o teatro é incendiado, e o rei coloca os irmãos em praça pública para que o povo escolhesse o criminoso. O povo escolhe Aquiles. Já votavam errado desde aquela época, né, minha filha? A partir dali, inicia um enredo de intrigas, poder e tragédia.

Atenção, temos spoilers violentos. Não quero que se indisponha comigo, porque eu nada poderei fazer pela sua pessoa.


LEIA MAIS: Megapro ameaça fechar Rajax após "insulto", entenda.

Ambientação e descrição dos personagens

A Cesareia não forneceu nenhuma ambientação. Quase nenhuma descrição nem dos personagens. Havia coisas que foram reveladas quase no final. Para você ter uma ideia, eu imaginava o Aristides bem mais velho, mas certeza nem tenho.


Claro que toda a história se passando na Grécia Antiga não é difícil imaginar os trajes, o ambiente como um todo, mas descobrir lá na beira do final que Melina, prima de Apolo e Aquiles tinha uma cicatriz no rosto, e que o autor só colocou ali para que o pai dela a reconhecesse nos trajes masculinos...

Mas isso não significa que eu seja fã das descrições longas que se estendem por um parágrafo inteiro. Existem, na verdade, duas maneiras de descrever um personagem ou cenário.

A primeira é aquela velha forma que todo roteirista conhece: "Maria (branca, acima do peso, veste calça jeans desbotada e uma blusa rasgada, tênis sujo. Está com cabelos pretos molhados)". Parece meio robótico e pode cansar se o autor perder o controle em meio a tantos personagens em uma única cena.

Já a segunda maneira de descrever personagens é mais natural: "Maria se esforça para entrar pela janela do primeiro andar. Seu peso quase trinca os vidros. Maltrapilha, seu tênis sujo de lama marca a parede branca do cômodo, e seus cabelos pretos molhados pingam no chão, deixando rastros".

A descrição do personagem precisa ser breve, o mais imediato possível, natural, se conseguir. Não vejo mais necessidade, por exemplo, em descrever a cor dos olhos e da pele se isso não acrescentar em nada na trama.

Em Anti-Herói, por exemplo, achei importante destacar que Nilo é loiro do olho azul, e fazer um contraste de como ele passa por cima da lei e nada acontece, enquanto Murilo, negro, teme dizer um "ai" e ser escoltado pela polícia. Inclusive, pausa pro merchan, porque Anti-Herói será reprisada dia 30 de março na CyberTV, no especial "QuarentenaDays".


LEIA MAIS: O que será que Hugo Martins tem a dizer sobre Maniac?

Alguns erros quase destruíram a Grécia Antiga

A pontuação foi um problema frequente em A Cesareia. Vírgulas onde não deviam, crase ou acentos indevidos. Além disso, a insistência em aniquilar o verbo no infinitivo (-ir), como nesse exemplo:

SOLDADO: Eterna conselheira, não podemos descumpri uma ordem do rei Petrus. O ordenado dele necessita ser acatado.

Mas, isso não foi tudo e, por incrível que pareça, não foi o pior. Algumas palavras foram usadas de forma indevida e que, até onde sei, não havia outro significado na Grécia Antiga. Veja abaixo alguns casos:


  • Misoginia - A rainha Minerva foi chamada de "misógina" pela mãe após descobrir que traía o rei. A rainha, por trair o rei, odiava mulheres? Não vi relação com o caso, a não ser pelo fato de que misoginia é um termo grego.
  • O pôr do sol da madrugada - Eládio, prisioneiro em Atenas, dá a ideia a Aquiles de fugir. O papo acontece de madrugada, quando Eládio, velho, cansado, diz que "o sol se põe daqui a algumas horas". Não mentiu, mas acho que antes o sol precisava nascer para se pôr em seguida.

O Deus ex machina


Depois que Aquiles é preso, Apolo começa a mostrar seu empenho pelo trono do rei, ao mesmo tempo que deseja saber o que de fato aconteceu aos seus pais.

A trama vai se desenvolvendo entre a esperteza de Apolo em conseguir casar com a filha de Petrus, a fuga de Aquiles da masmorra, o amor platônico entre Ciro e Heros, e uma vingança que vai respingando em cada um como se fosse dominó.

No meio disso tudo, há personagens pelos quais me simpatizei, como o Urias, Eládio, Heros e Ciro, mas há outros que caíram na inverossimilhança.

Como o rei Hermes, que diante da mentira deslavada de Aquiles para entrar em um combate em Atenas, deixou claro que não tinha nenhum problema com os atenienses. Também pudera! Aquiles inventou um sonho no qual Hermes era zombado pelo povo de lá!

No entanto, Aquiles acabou convencendo o rei, que decidiu invadir Atenas. Oras! Aquiles se esqueceu de Eládio? O homem de confiança de Hermes que estava preso com ele na masmorra de Atenas?

A propósito, só soubemos que o Eládio foi preso porque cometeu um crime de usurpação, mas não explicou quem ele usurpou, afinal, homem de confiança do rei de Esparta! Imagine o rei Hermes sabendo que o rei Petrus II mandou prender Eládio? Não seria suficiente para um atrito? Aquiles nem precisaria dizer que estava preso também.

Deus ex machina se preparando para entrar em cena.


Portanto, o autor usou de um Deus ex machina para justificar a entrada triunfante de Aquiles em Atenas e conseguir destronar seu irmão, Apolo. Deus ex machina, para quem não sabe, é o uso de uma solução inesperada para concluir uma obra. Samuel Brito optou por um sonho de Aquiles, um sujeito desconhecido e que, de cara, não havia despertado tanta confiança ao rei.

As tragédias femininas em A Cesareia


Preciso destacar as mulheres e suas tragédias em A Cesareia, porque ficou bastante claro a não importância delas na Grécia Antiga:


  • Leônidas -  dona do bordel, com algum respeito dado pelo rei Petrus II. Algum.
  • Agatha - princesa de Atenas, largada após casamento, indecisa que só, não sabia se odiava o pai, a mãe, a vó, ou a própria vida. No fim, se tornou assassina mas também não sabia o porquê. Depois lembrou que era porque a vítima levou a família real à tragédia;
  • Senhora Martine - conselheira da família real, aparentemente uma boa pessoa, mas se perde do meio para o fim, porque uma hora parece realmente arrependida de seus atos infames, para depois se revelar cruel do nada. Um exemplo de vai e vem de personalidade. Mas isso, Agatha tinha a quem puxar.
  • Anastasia - largada após casamento também. Seu noivo, príncipe Heros, fugiu com Ciro;
  • Rainha Minerva de Atenas - flagrada em atos inapropriados pelo rei Petrus II. Foi rechaçada em praça pública;
  • Melina - quase virou cortesã após ser vendida pelo pai. Tem um rompante de ódio após o pai ser assassinado por quem ela confiava. Decide fazer algo, e nada faz. Termina apenas ao lado de Aquiles proclamando a tal da Cesareia.



Sim, a mulher da Grécia Antiga foi bem retratada em A Cesareia: frágil ou puta, o sexo feminino não teve vez na minissérie. Infelizmente, a mulher não era nada e o autor soube mostrar isso de forma a não forçar nada.

Conclusão

A Cesareia apresentou uma boa história, começando pela ambição de Apolo ao trono, passando pela vingança de Aquiles e uma inspiração no "Conde de Monte Cristo".

Só torno a ressaltar que, o uso do Deus ex machina é uma falha de roteiro que pode detonar toda uma expectativa da história. Afinal, eu esperava que Aquiles soubesse conquistar o rei, retornasse triunfante e, dessa forma, ganhasse uma cavalaria disposta a lutar por ele.

Mas, A Cesareia foi boa de ler, uma história bem marcante, triste, trágica, que apesar dos pesares, teve seus pontos altos e mereceu seu destaque. Por exemplo, foi surpreendente a trajetória de Apolo, sua postura que já vinha se modelando desde a primeira cena, quando Aquiles disse sentir falta dos pais, mas Apolo sentia falta da terra.

Quero destacar também que, enquanto Apolo era visto como o forte e destemido, mas terminou enganado, Aquiles começou como o cara sensível, oprimido, até revelar seu lado opressor.

Essa foi a review de A Cesareia longa demais para você ter lido rápido. Se gostou, compartilhe em suas redes sociais e aguarde o próximo post, que não sei quando virá.

Postar um comentário

0Comentários

Please Select Embedded Mode To show the Comment System.*

#buttons=(Aceitar !) #days=(20)

Nosso site usa cookies para melhorar sua experiência. Saiba mais
Accept !